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A insurreição e o prevalecer de Putsch: O renascimento dos 21 anos

  • Akasuma Lean Vicci
  • 26 de abr. de 2016
  • 16 min de leitura

O livro das torturas: capítulos 10, 09, 60 e 04.

Introdução


No solo verde e amarelo onde o Cristo Redentor abre os braços para acolher a todos vivemos o pior de todos os episódios da história desse país chamado de República Federativa do Brasil, a terra que um dia foi o berço da liberdade para os povos que aqui moravam – os índios – passou a ser uma dita Monarquia comandada pela elite Portuguesa no chamado período do descobrimento, alguns anos mais tarde após conseguir sua independência tornou-se uma República comandada por um chefe de Estado eleito pelo povo, o chamado Presidente da República. No dia 31 de março de 1964 (o dia que durou 21 anos) a República foi ferida e o Presidente João Goulart foi deposto pelos militares apoiados por alguns civis, assim deflagrou-se a tão demita Ditadura Civil-Militar (um regime sem nenhuma ponta de democracia onde o povo não participa de forma alguma, apenas uma instancia tem o poder a sua disposição). Passados os 21 anos sombrios da Ditadura, no dia 15 de março de 1985 o Brasil retorna a tão sonhada Democracia, assim, o país retoma o Posto de República com a posse do Presidente José Sarney eleito indiretamente por um colégio eleitoral. Sarney era vice na chapa com Tancredo Neves, mas após adoecer e ir a óbito antes de sua posse Sarney assume a liderança do Brasil dando fim ao período ditatorial.


Muitos foram os casos de tortura, exílio e censuras que a população sofreu quando os militares estavam no comando do país. Inúmeros ainda permanecem por baixo dos panos, outros vieram à tona para o âmbito nacional. Porém poucos são os rostos de militantes ainda vivos que passaram pelas mãos dos algozes fardados.


Quatro dos inúmeros casos de sofrimento no período da Ditadura irei apresentar nesse documento, que possivelmente pode ser meu último devido ao cenário atual no nosso país. Eles estão presentes respectivamente nos capítulos 10, 09, 60 e 04 do livro das torturas, são eles: Elizabeth Mendes de Oliveira (capítulo 10), Dilma Vana Rousseff (capítulo 09), Maria Amélia de Almeida Teles (capítulo 60), e Antônio Guilherme Ribeiro Ribas (capítulo 04).


O maior foco dentre esses quatro relatos é o nome que une três deles, Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, comandante do DOI-Codi (centro de repressão do exercito) e de acordo com o Deputado Jair Bolsonaro “ o terror de Dilma”. Ustra foi o único militar brasileiro declarado torturador pela Justiça. De acordo com a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos, seu nome está relacionado a pelo menos 60 casos de mortes durante seu Governo.


Capítulo 10


“Fui presa duas vezes. Na primeira, não fui torturada fisicamente. Na segunda, foi total. Fui torturada [em 1970] e denunciei [o coronel Ustra]. Isso me marcou profundamente. Não desejo isso para ninguém – nem por meus inimigos. A tortura física é a pior perversidade da raça humana; a psicológica, idem.” ~Bete Mendes


Elizabeth Mendes de Oliveira (mais conhecida como Bete Mendes), nascida em Santos no dia 11 de maio de 1949, é uma atriz e militante política brasileira. Uma das fundadoras do Partido dos Trabalhadores (PT), pelo qual se elegeu Deputada Federal pela primeira vez na legislatura 1983-87. Porém foi expulsa do partido por votar ainda no regime das eleições indiretas em Tancredo Neves para Presidente da República, o rompimento com o partido não a impediu de apoiar as candidaturas presidenciais de Lula.


Participou ativamente de movimentos sociais e sindicais, o apoio às greves do Metalúrgicos e o movimento pela Anistia, é associada ao Movimento Humanos Direitos (organização não-governamental de artistas brasileiros, lutando pelos direitos humanos no Brasil).


Foi presa pela primeira vez em 1970 pelo DOI-Codi (Destacamento de Operações Informações do Centro de Operações para Defesa Interna, responsável por combater os grupos de esquerda) ficou detida por quatro dias. Mais tarde no mesmo ano entre setembro e outubro foi novamente coagida sofrendo então torturas sobre o comando do Coronel Ustra. Ficando sob custódia por 30 dias.


Foi obrigada a abandonar o Curso de Sociologia pelo então decreto-lei vigente Federal do Brasil 477 de 1969 (foi baixado pelo então presidente Artur da Costa e Silva durante o regime militar brasileiro. O decreto-lei previa a punição de professores, alunos e funcionários de universidades considerados culpados de subversão ao regime).


Bete Mendes relatou em uma carta ao recém empossado Presidente da República José Sarney depois de se deparar com seu torturador em cumprimento dos compromissos oficiais como Deputada Federal (Ustra era adido militar na embaixada brasileira em Montevidéu). Bete engoliu a seco remoendo o sofrimento causado pelas lembranças, decidiu manter as aparências e a tranquilidade exigida pelo cerimonial, pois Ustra ao reconhecê-la aproximou-se com sua mulher e a cumprimentou num gesto de querer justificar o passado. Ao retornar ao Brasil Bete entregou a carta a Sarney denunciando Ustra:


“Não posso calar-me ante a constatação de uma realidade que reabriu em mim profunda e dolorosa ferida... Digo-o, presidente, com conhecimento de causa: fui torturada por ele. Imagine, pois, vossa excelência o quanto foi difícil para manter a aparência tranquila e cordial exigida pelo cerimonial: Pior que o fato de reconhecer meu antigo torturador, foi ter de suportá-lo seguidamente a justificar a violência cometida contra pessoas indefesas e de forma desumana e ilegal como sendo para cumprir ordens e levado pelas circunstâncias de um momento”.


Antecipando-se ao contra-argumento da Lei da Anistia, a carta continuava:


"Sei que muitas vozes se levantarão na lembrança da anistia. Lembro, porém, que a anistia não tornou desnecessária a saneadora conjunção de esforços de toda a Nação com o objetivo de instalar uma nova ordem política no País. O arbítrio cedeu lugar ao diálogo democrático. A Nova República, sonho de ontem, é a realidade palpável de hoje. Mas ela não se consolidará se no atual governo, aqui ou alhures, elementos como o coronel Brilhante Ustra estiverem infiltrados em quaisquer cargos ou funções.


Por isso, denuncio-o aqui. E peço, como vítima, como cidadã e como deputada federal, providências imediatas que culminem com o afastamento desse militar das funções que desempenha no vizinho país. Tenho certeza que uma determinação sua nesse sentido significará, antes de tudo, uma demonstração de respeito ao sofrimento de milhares de brasileiros e uruguaios que acabam de despertar de uma longa noite de arbítrio, na qual a tortura e os torturadores fizeram parte de uma grotesca, triste e dolorosa realidade."


Bete Mendes representava o primeiro escândalo do governo Sarney, pois foi uma das primeiras a abrir o jogo e entregar os reais acontecimentos que permearam os 21 anos de Ditadura e governo dos Militares. Em contrapartida a denúncia da então Deputada sem partido provocou o debate sobre o Lei da Anistia e pressionou Sarney que como medida pediu o afastamento do militar. Mas nada foi concretizado, os militares resistiram e Ustra permaneceu no cargo, Sarney optou por deixar tudo como estava declarando na reunião do Conselho Político que as denuncias de torturas e a divulgação da lista de subversivos eram uma tentativa de revanchismo e deviam “ser sepultadas definitivamente porque não interessavam ao país”.


O desmascaramento de Bete não surtiu efeito de punição para Ustra e o caso foi esquecido pela Justiça. Os únicos sinais que permaneceram foram os de torturas físicas e psicológicas sofridas pela mesma que só superou todo o ocorrido com a ajuda de tratamento psicológico e com seu trabalho de atriz.


“Superei isso com tratamento psicológico e com trabalho. Agradeço à família, a classe artística, aos amigos que foram meu alicerce”


CASO BETE MENDES – CASO OMISSO PELA JUSTIÇA

Capítulo 09

“Fantasmas de um passado doloroso e triste não possam mais se proteger nas sombras do silêncio e da omissão.” ~Relato de Dilma após receber da Comissão Nacional da Verdade o relatório final sobre as violações de direitos humanos ocorridas no período da ditadura civil-militar no Brasil.


Dilma Vana Rousseff, nascida em Belo Horizonte no dia 14 de dezembro de 1947, é uma economista e política brasileira, atual Presidenta da República pelo PT. Primeira mulher eleita para o posto de chefe do Estado e chefe de Governo em toda história do Brasil. Ingressou na luta armada de esquerda logo após ter se interessado pelo socialismo ainda na sua juventude e com o eminente Golpe Militar instaurado no ano de 1964.


Fazia parte do Comando de Libertação Nacional (COLINA) e da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares, assim como Bete Mendes) ambas as organizações defendiam a luta armada contra o governo militar.


No período da Ditadura Civil Militar, Dilma passou três anos detida (1970-1972) sob custódia primeiro da Operação Bandeirante (OBAN) e posteriormente pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS). As sessões de torturas foram realizadas pelo OBAN, marcas que até hoje Dilma leva em suas memórias de um passado de lutas pela liberdade política e pela retorno da Democracia.


“Dilma teria desenvoltura e grande capacidade de liderança, impondo-se perante homens acostumados a mandar. Não teria participado diretamente das ações armadas, pois era conhecida por sua atuação pública, contatos com sindicatos, aulas de marxismo e responsabilidade pelo jornal O Piquete. Apesar disso, aprendeu a lidar com armas e a enfrentar a polícia.”

Segundo companheiros de militância.


Dilma era conhecida como a Joana D’Arc da subversão, ela era considerada um dos cérebros dos esquemas revolucionários, como relata um integrante de buscas da OBAN e o promotor que denunciou a VAR-Palmares, considerada acima de tudo a ponte entre o comando nacional e regional.


Após prenderem José Olavo Leite Ribeiro que mantinham reuniões três dias por semana com Dilma e o torturarem após um dia inteiro ele foi obrigado a revelar o lugar de encontro com outro participante do movimento. No dia 16 de janeiro de 1970, em um bar na Rua Augusta (SP), foi obrigado a ir acompanhado de policiais disfarçados ao encontro do seu companheiro de movimento. Ao capturarem seu colega e no momento que estavam saindo do local, Dilma (que não estava sendo esperada no encontro, apareceu) e ao perceber o estranho movimento tentou fugir sem ser percebida, mas ao ser abordada pelos policiais, os mesmos encontraram-na com uma arma em sua posse e logo foi detida. O motivo pelo qual Dilma tinha vinda a São Paulo teria sido para esconder as armas que seu grupo ficara responsável para a luta contra o governo.


De acordo com o relato:


“Foi torturada por vinte e dois dias com palmatória, socos, pau de arara e choques elétricos. No meio militar, há quem veja o relato de Dilma com ironia e descrédito, especialmente quanto à possibilidade de alguém sobreviver a tanto tempo de tortura. Posteriormente, Dilma denunciou as torturas em processos judiciais e a Comissão Especial de Reparação da Secretaria de Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro aprovou pedido de indenização por parte de Dilma e de outras dezoito pessoas.”

Dilma foi condenada a seis anos de prisão, mas após o cumprimento de metade da pena o Supremo Tribunal Militar reduziu sua pena para dois anos e um mês. Foi caçada politicamente por dezoito anos. Seu nome constava numa lista que estava na posse de Carlos Lamarca, com o nome de presos que seriam trocados por sequestrados.


No dia 17 de junho de 2012 o site Enem.com.br publicou um artigo sobre Dilma “Documentos revelam detalhes da tortura sofrida por Dilma em Minas na Ditadura”:


“A presidente Dilma Vana Rousseff foi torturada nos porões da ditadura em Juiz de Fora, Zona da Mata mineira, e não apenas em São Paulo e no Rio de Janeiro, como se pensava até agora. Em Minas, ela foi colocada no pau de arara, apanhou de palmatória, levou choques e socos que causaram problemas graves na sua arcada dentária [devido a socos que recebeu do então coronel Ustra]. É o que revelam documentos obtidos com exclusividade pelo Estado de Minas , que até então mofavam na última sala do Conselho dos Direitos Humanos de Minas Gerais (Conedh-MG). As instalações do conselho ocupam o quinto andar do Edifício Maletta, no Centro de Belo Horizonte. Um tanto decadente, sujeito a incêndios e infiltrações, o velho Maletta foi reduto da militância estudantil nas décadas de 1960 e 70.


Perdido entre caixas-arquivo de papelão, empilhadas até o teto, repousa o depoimento pessoal de Dilma, o único que mereceu uma cópia xerox entre os mais de 700 processos de presos políticos mineiros analisados pelo Conedh-MG. Pela primeira vez na história, vem à tona o testemunho de Dilma relatando todo o sofrimento vivido em Minas na pele da militante política de codinomes Estela, Stela, Vanda, Luíza, Mariza e também Ana (menos conhecido, que ressurge neste processo mineiro). Ela contava então com 22 anos e militava no setor estudantil do Comando de Libertação Nacional (Colina), que mais tarde se fundiria com a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), dando origem à VAR-Palmares [...] ”


Em entrevista ao site UOL para relatar sobre como era a Dilma que lutou durante a Ditadura, um companheiro de militância de Dilma – Nahas – disse que todos os que lutaram e foram presos tiveram seus objetivos finalizados:


"A gente cumpriu um objetivo fundamental, que era não deixar a ditadura passar batida. A gente resistiu, perdemos, fomos massacrados, mas a nossa derrota, paradoxalmente, foi uma vitória, porque a ditadura não passou batida. Ela ficou marcada por essa resistência, pelo nosso martírio e pela brutalidade dos métodos repressivos".


CASO DILMA ROUSSEFF – INDENIZADA JUDICIALMENTE E RECONSTRUIU SUA VIDA EM PORTO ALEGRE (RIO GRANDE DO SUL)


Capítulo 60

“Quando fui presa, ou fomos presos! Porque era eu, meu companheiro e mais um dirigente do Partido Comunista. Logo nós fomos encaminhados para as salas de tortura sempre nus porque eles arrancavam suas roupas o tempo todo. Eu tinha sido torturada a noite toda nua. Eu estava urinada, com vômito e já tinha levado choque no corto todo, exceto no nariz e nos olhos.” ~Amelinha


Maria Amélia de Almeida Teles, militante do Partido Comunista do Brasil (PcdoB), foi presa em 28 de dezembro de 1972 pela OBAN e submetida a várias sessões de tortura realizadas pessoalmente pelo major do exercito Carlos Alberto Brilhante Ustra.


Seus filhos de 4 e 5 anos na época foram sequestrados e levados para a OBAN que presenciaram os pais sendo torturados um por um.


“A tortura não era apenas física, mas também psicológica. Não se consolida uma democracia com cadáveres em sepultos e nós temos muitos”


Amélia em depoimento revelou que os filhos ao serem expostos a tortura psicológica ficaram traumatizados e tiveram que passar por tratamento mais tarde. O choque foi tamanho ao ver os pais naquele estado que o corpo começou a agir de forma desestruturada. O filho mais novo retrocedeu psicologicamente e a filha mais velha se tornou madura muito cedo, menstruando aos sete anos de idade.


Amelinha em 2005 juntamente com sua família moveu uma ação declaratória contra Ustra que três anos depois foi o primeiro agente militar então declarado torturador nacionalmente.


CASO AMÉLIA TELES – RESPONSÁVEL POR CONSOLIDAR A VERDADE POR TRÁS DA TÃO PROMETIDA DEMOCRACIA DOS MILITARES


Capítulo 04

“A quem possa interessar, vamos em frente” ~Ribas


Antônio Guilherme Ribeiro Ribas, nascido na cidade de São Paulo em 20 de setembro de 1946 era o mais novo de quatro irmãos. Seu pai Walter Scheiba Pinta Ribas dizia que “todo homem deveria passar pelo menos por uma revolução” e isso foi fixado em sua cabeça. Mais tarde ingressou juntamente com seu irmão Dalmo no PcdoB.


Na segunda metade da década de 1960, quando estudava no Colégio Estadual Brasílio Machado, Guilherme começou a atuar no movimento secundarista. O nome de Guilherme unificou todas as correntes da esquerda estudantil, apesar de ter relação com uma força política ainda com pouca expressão no movimento estudantil paulista: o PCdoB.


Em 1968 Ribas foi um dos porta-vozes do movimento estudantil, entrevistas suas podiam ser lidas na edição de 15 de agosto do Jornal Correio da Manhã. Na edição do dia 03 de setembro do mesmo Jornal disparou a seguinte manchete:


“A ditadura no dia 7 de setembro iria demonstrar sua força, ostentando o seu aparato de repressão que serve para sustentar as classes privilegiadas. O povo não deverá prestigiar esta manifestação dos ‘gorilas’ a serviço do imperialismo americano. Dia 7 de setembro é o dia da Pátria e, portanto, um dia de luta pela liberdade e para isso seria necessária a violência popular”


Um policial foi infiltrado no movimento estudantil ficou de olho em Ribas no desfile de sete de setembro. E como dias antes Ribas anunciou que os estudantes fariam uma manifestação em protesto ao regime em pleno desfile. Quando novamente estava frente aos companheiros distribuindo panfletos Ribas foi preso pelos militares, resultando em trinta e quatro dias de prisão.


Guilherme Ribas levantou muitas suspeitas dos militares devido a sua tomada rápida de espaço perante os movimentos estudantis e foi muito visado até ser preso e torturado.


Depois de ser solto e participar do 30º Congresso da UNE (União dos Estudantes) Ribas foi preso novamente acusado de ter arquitetado todo o congresso, e então, foi levado juntamento com José Dirceu para o presídio de Tiradentes ficando um ano e seis meses preso.


Foi liberto em 1970 e logo entrou na clandestinidade retomando a luta contra os repressores. Mudou-se para o sul do Pará e em 1972 o Exército entrou na região, o conflito estava mais do que pronto. Ribas foi morto em 1973 durante a terceira e última campanha militar contra os guerrilheiros do exército.


Seu corpo nunca foi encontrado e entregue a família, como conta José Dirceu:


“Infelizmente, Antônio Ribas está na vergonhosa e dolorosa lista de desaparecidos políticos, na verdade, morto pela ditadura. Deixou, porém, um legado de luta, honra e persistência em nome da liberdade e da democracia, frutos que, hoje, são colhidos por toda a nação.”


CASO GUILHERME RIBAS – O ESTUDANTE INJUSTIÇADO QUE ADENTROU NA LUTA CONTRA OS REPRESSORES

Anos de Chumbos – Os Atos Institucionais

Ficou conhecido como anos de chumbo o período em que estava no poder o general Emilio Garrastazu Medici, o terceiro presidente eleito após o golpe instaurado em 64, favorável a um aumento dos métodos repressivos e antidemocráticos.


Tendo tomado posse no auge do Milagre Econômico, Medici pode mascarar a repressão e tortura conduzida nos porões da ditadura. Porém o governo ficou ainda mais famoso pela instauração do AI-5 (Ato Institucional número 5) que decretou censura a todos os meios de comunicação. A punição para o descumprimento do AI-5 era a tortura, prisão, investigação, exilio e demais meios ditatoriais.


Nesse período a guerrilha rural ganhou força, na chamada Guerra do Araguaia onde o exercito entra em conflito direto com os militantes do PCdoB, entre eles Ribas.


Os atos constitucionais, como o AI-5, foram meios do governo para dar fim na liberdade política da população e moldar o Brasil conforme os ideais militares. Ao todo são 17 atos que foram editados entre 1964 e 1969, aprovados sem qualquer consulta popular ou legislativa.


Em outras palavras:


“Em outras palavras, os atos institucionais literalmente "passavam por cima" de qualquer garantia constitucional, garantia individual ou coletiva básica. São os instrumentos que nos permitem afirmar sem qualquer sombra de dúvida que o regime instalado pelos militares durante cerca de vinte anos no Brasil tratava-se de uma verdadeira ditadura”

AI-1: Determinava eleições indiretas para a presidência da República.


AI-2: Emendou vários dispositivos da Constituição de 1946 e, sobretudo, tornou indireta a eleição para presidente da República. A partir de então, o Poder Judiciário também sofreu intervenção direta do Poder Executivo. Desta forma, os julgamentos das ações dos revolucionários deixaram de ser competência da justiça civil e o Estado entrou em um regime de exceção ainda mais repressor das posições contrárias ao regime.


AI-3: Estabelecia que os governadores e vices seriam eleitos indiretamente por um colégio eleitoral, formado pelos deputados estaduais. Também estabeleceu que os prefeitos das capitais, seriam indicados pelos governadores, com aprovação das assembleias legislativas. Estabeleceu o calendário eleitoral, com a eleição presidencial em 3 de outubro e para o Congresso, em 15 de novembro.


AI-4: Convocou ao Congresso Nacional o estabelecimento de uma nova carta constitucional, a Constituição de 1967, que revogaria de forma definitiva a Constituição de 1946.


AI-5: Concedia ao Presidente da República, dentre outros, os poderes de cassar mandatos, intervir em estados e municípios, suspender direitos políticos de qualquer pessoa e, o mais importante, decretar recesso do Congresso e assumir suas funções legislativas no ínterim. O AI-5 também suspendeu o Habeas Corpus para crimes políticos. Por consequência, jornais oposicionistas ao regime militar foram censurados, livros e obras "subversivas" foram retiradas de circulação e vários artistas e intelectuais tiveram que se exilar no estrangeiro.


AI-6: Reduziu de 16 para 11 o número de ministros do STF. Estabeleceu também que os crimes contra a segurança nacional seriam julgados pela justiça militar e não pelo STF.


AI-7: Suspendendo todas as eleições até novembro de 1970.


AI-8: Estabelecendo que estados, Distrito Federal e municípios com mais de 200.000 habitantes poderiam fazer reformas administrativas por decreto.


AI-9: Estabeleceu regras para a reforma agrária cuja doutrinação tinha cunho estritamente conservador. Este ato institucional dava poder ao presidente para delegar as atribuições para a desapropriação de imóveis rurais por interesse social, sendo-lhe privativa a declaração de zonas prioritárias.


AI-10: Determinava que as cassações e suspensões de direitos políticos com base nos outros AIs acarretariam a perda de qualquer cargo da administração direta, ou indireta, instituições de ensino e organizações consideradas de interesse nacional.


AI-11: Estabeleceu novo calendário eleitoral, Fixa a data das Eleições para Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores, suspensas em virtude do disposto no Artigo 7º, do AIT 7/1969, de 26 de fevereiro de 1969, bem como as eleições gerais visando a mesma finalidade, e para os Municípios em que tenha sido decretada a intervenção federal, com fundamento no artigo 3º do AIT 5/1968, de 13 de dezembro de 1968, ou cujos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito estejam vagos por outro motivo, e as estabelecidas pelo artigo 80, do DEL 411/1969, de 8 de janeiro de 1969, serão realizadas no dia 30 de novembro de 1969, extingue a justiça de paz eletiva, respeitados os mandatos dos atuais juízes de paz, até o seu término.


AI-12: Esclarece que, enquanto durar o impedimento temporário do Presidente da República, Marechal Arthur da Costa e Silva, por motivo de saúde, as suas funções serão exercidas pelos Ministros da Marinha de Guerra do Exército e da Aeronáutica Militar, nos termos dos Atos Institucionais e Complementares, bem como da Constituição de 1967.


AI-13: Estabelecia o "banimento do território nacional de pessoas perigosas para a segurança nacional".


AI-14: Estabelecia a modificação do artigo 150 da constituição, com a aplicação da pena de morte nos casos de comprovada participação em atos de terrorismo que resultasse em morte e também em "guerra externa, revolucionária ou subversiva".


AI-15: Fixando as eleições nos municípios sob intervenção federal para 15 de novembro de 1970. Colocando em vigor uma nova Lei de Segurança Nacional, que estabelecia que todo condenado à morte seria fuzilado se em 30 dias não houvesse por parte do presidente da República a comutação da pena em prisão perpétua. Previa-se também a prisão de jornalistas que divulgassem notícias "falsas ou tendenciosas" ou fatos verídicos "truncados ou desfigurados".


AI-16: Declarou vagos os cargos de presidente e vice-presidente da República, marcando para o dia 25 seguinte a eleição presidencial indireta pelo Congresso Nacional, em sessão pública e por votação nominal. Fixou também o fim do mandato do presidente eleito em 15 de março de 1974, e prorrogou os mandatos das mesas da Câmara e do Senado até 31 de março de 1970.


AI-17: Autorizava a junta militar a colocar na reserva os militares que "tivessem atentado ou viessem a atentar, comprovadamente, contra a coesão das forças armadas". Uma forma encontrada para conter a oposição encontrada pela indicação de Médici.


Atualidade: Um novo Golpe?

Com o atual governo brasileiro sendo ameaçado pela oposição, o processo de impeachment da Presidenta Dilma Roussef foi aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 17 de abril de 2016. Vejo que estamos retomando ao episódio parecido com o de 64 onde João Goulart perdeu seu posto e o golpe foi deflagrado, a democracia foi ferida e adentramos em uma ditadura que durou 21 anos.


Promessas de que iremos sair de uma possível Crise Nacional ao retirarmos das mãos da Chefe de Estado o seu mandato que foi adquirido legalmente. Como prevenir que o país entre em colapso caso pessoas acusadas de corrupção entre no lugar daquela que foi impedida?


Será que todos os episódios que presenciamos até o momento não servem de alerta para um novo golpe em processo de instauração?


Uma Democracia que ainda se recupera de 21 anos de torturas e exílios agora novamente é ameaçada pelo governo de direita, aqueles que se dizem em nome da família, de Deus e do povo. Julgam estar fazendo o certo, mas que demonstraram no dia 17 de abril que não representam boa parte da população brasileira.


Quando iremos abrir os olhos e sair do analfabetismo político para impedir que tamanho golpe renasça mais uma vez? Cabe agora pensarmos e rever nossos conceitos.


Creio que muitos se perguntam: Jean ou Bolsonaro? Jandira ou Cunha? Dilma ou Temer? Será que realmente saberemos responder tais perguntas?


Talvez um dia consigamos. Mas vale ressaltar que não pretendo deixar o mesmo dia, aquele 31 de março de 1964, o dia que durou 21 anos que se repita mais uma vez e ameace a Democracia que lutamos por anos para conquistá-la.

 
 
 

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© 2015 por Maurício Rosendo Leandro dos Santos.

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